LIVROS E BICHOS

Este é o blog da Tércia Montenegro, dedicado preferencialmente a livros e bichos - mas o internauta munido de paciência também encontrará outros assuntos.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Violência contra os professores

Lamentável AO EXTREMO a violência a que os professores do Estado do Ceará estão sendo submetidos - e não me refiro apenas ao episódio do confronto policial acontecido ontem, durante manifestação de greve na Assembleia Legislativa. Para além da agressão física, existe há tempo demais essa agressão moral, com humilhações que passam por aspectos econômicos mas, acima de tudo, refletem o grau de desconsideração que a nossa política dedica aos educadores. Ser professor, no Brasil e no Ceará, especialmente, está se tornando um ato de resistência, uma bandeira de inconformismo diante de tanta mediocridade recompensada com sucesso e glória financeira (tome-se como exemplo disso a primeira dezena de nomes políticos que lhe passem pela cabeça agora - é fácil escolher, dentre tantas opções escandalosas...).
Para saber mais a respeito do movimento de greve dos professores estaduais, sugiro o endereço da APEOC:
http://www.apeoc.org.br/

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Poe

Dizia o grande: Eu me sentiria ofendido se todo mundo me compreendesse.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Contra o suicídio

Crônica minha publicada hoje no jornal O Povo. Disponível em http://www.opovo.com.br/app/opovo/opiniao/2011/09/28/noticiaopiniaojornal,2306113/contra-o-suicidio.shtml)

CONTRA O SUICÍDIO

A imprensa não costuma noticiar mortes por suicídio. Tal aspecto, por um lado, é sinal de respeito para com a família enlutada, que certamente não precisa de holofotes midiáticos sobre si, naquele momento. Por outro lado, o silêncio é também uma medida de preservação da vida, se pensamos que certos imitadores podem achar que se matar virou uma espécie de moda, propagada pelos veículos de comunicação. Afinal, dizem que depois que Werther (personagem de Goethe) deu cabo da própria existência, houve uma imensa adesão de fãs, buscando copiar aquele destino trágico... Há ainda o fato de que o suicídio permanece sendo um tabu, no sentido religioso e em vários outros aspectos. Silenciar, então, parece uma boa saída para não criar polêmicas ou problemas.
Quando acontece, porém, de uma pessoa famosa se matar, não se pode evitar a notícia – embora ela deva ser transmitida com cautela. Um “disfarce da situação” seria desastroso e, a longo prazo, uma falsidade histórica. Foi pensando assim que, outro dia, estava com o amigo Urik Paiva (que é especialmente imaginativo) desenvolvendo esse tipo de suposição. Imaginamos que se instalava no mundo uma paranoia do termo “suicídio”. Isso chegava a tal ponto que as divulgações dos óbitos passariam a ser distorcidas, com elementos fantasiosos para negar os gestos voluntários. Assim, por exemplo, a poetisa Ana Cristina César, que se jogou de um edifício da década de 80, poderia ser computada como uma vítima de acidente com bungee jumping. Sylvia Plath, escritora que abriu o forno e pôs a cabeça lá dentro, na verdade teria escorregado em batatinhas enquanto cozinhava e – plath! – caiu no chão, fraturando o crânio.
 Nessa linha de raciocínio, o afogamento de Virginia Woolf também surgiria como uma fatalidade. Diriam que a romancista inclusive era exímia nadadora e costumava atravessar metros do rio Ouse todas as tardes – infelizmente, naquele 28 de março um polvo gigantesco surgiu e laçou as pernas da escritora, arrastando-a para as profundezas da água. 
O autor japonês Mishima tampouco teria cometido haraquiri, mas sua morte foi resultado de uma brincadeira desastrosa, com a faca usada para limpar o peixe. E Hemingway jamais atirou contra si mesmo; ao contrário, foi alvejado por um colega caçador (que não estava tão camuflado quanto ele), num safári.
A lista de hipóteses cresce para além dos literatos, e de repente nos damos conta da enorme quantidade de suicidas famosos. O espaço para este texto chega ao fim, mas a imaginação, claro, nunca acaba. Nosso exercício de censura ao suicídio passa pelo riso porque divertir-se talvez seja a melhor maneira de sentir-se vivo.

Tércia Montenegro (escritora, fotógrafa e professora da UFC)

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Os agelastos

OS AGELASTOS

No livro A cortina, de Milan Kundera, encontrei uma passagem que me fisgou, numa imediata e total concordância. Diz o autor tcheco: “Existem pessoas cuja inteligência admiro, cuja honestidade estimo, mas com as quais me sinto pouco à vontade; censuro minhas opiniões para não ser mal compreendido, para não parecer cínico, para não magoá-las com palavras levianas. Elas não vivem em paz com o cômico.” Tais indivíduos são chamados de agelastos, conforme o neologismo criado por Rabelais, para designar “aqueles que não sabem rir”. Ora, Kundera, nesta curta reflexão, tocou num ponto que me parece fundamental na existência: a necessidade do humor – e o consequente incômodo diante dos que não sabem praticá-lo.
            Claro que o riso requer ocasião propícia, e o tema que diverte uma pessoa pode soar desprezível para outra. Mas, longe de especificidades, os agelastos são o tempo todo austeros, compenetrados e sensatos. Na companhia deles, qualquer um se sente bobo ao arriscar uma anedota. Em vez da cumplicidade, tem-se como resposta um olhar de censura, acompanhado de um suspiro. Os agelastos pensam que os bem-humorados são imaturos e perdem tempo com amenidades.
            Ao contrário, muita gente exercita a inteligência através do humor, estabelecendo determinadas ligações entre assuntos, percebendo sutilezas invisíveis para os outros... Óbvio, entretanto, que o território do humor não escapa de estranhezas, e nem todo mundo que ri é necessariamente simpático ou extrovertido. Às vezes uma gargalhada pode dar medo: pensem, por exemplo, no Coringa. Mas nem precisamos apelar para a ficção; na vida corriqueira, quem nunca conheceu alguém com um riso sinistro ou talvez diabólico?
Lembro que certo dia eu conversava com um professor de mecatrônica. Ele me falava algo sobre sistemas robóticos, em profunda seriedade. De repente, uma criancinha que passava ao nosso lado caiu do skate e esborrachou-se no chão. O professor explodiu numa risada hedionda, olhando para o menino – que, lógico, saiu chorando. Poucos segundos depois, eu também dava o fora, para não participar daquele senso de humor bizarro.
O riso (e seus motivos) sempre carrega marcas pessoais. Mas os agelastos nunca se expandem em qualquer forma de alegria, e são esses os indivíduos de fato tristes – embora eles prefiram o termo “sérios” ou “circunspectos” para definir-se.

 Tércia Montenegro (escritora, fotógrafa e professora da UFC)
Crônica publicada hoje no jornal O Povo. Disponível em http://www.opovo.com.br/app/opovo/opiniao/2011/09/14/noticiaopiniaojornal,2297910/os-agelastos.shtml)

domingo, 11 de setembro de 2011

Nem tão Biutiful assim

Após tantos anúncios promissores e expectativas vibrantes, finalmente vi o novo filme do Iñarritu, Biutiful. Claro que o Javier Bardem já era um atrativo suficiente (ele é um ator só comparável a um Al Pacino ou um De Niro), mas o roteiro em si escorrega em alguns aspectos que não convencem. A personagem Marambra (sic!), esposa de Uxbal, aparece estereotipada em sua angústia bipolar e alcoólatra, e o destino sórdido dos imigrantes já foi explorado de modo mais interessante em vários outros filmes. Mas o problema realmente, para mim, foi o tema da espiritualidade, via atuação-médium de Uxbal. A discussão sobre o além-morte fica naqueles temas óbvios (que jamais terão minha concordância) a respeito de missão na terra, obrigações a cumprir, salvação etc. Sobretudo é difícil de acreditar que alguém que acabou de morrer (como o menino que Uxbal vê em espírito, no velório) esteja "penando" numa crise de consciência por haver roubado um relógio! Sinceramente, acho que as almas têm mais o que fazer, e um morto deve estar num nível superior o bastante para desconsiderar questões materiais ou culpas terrenas (todas infligidas por convenções sociais). A mistura entre espírito e compromisso material é o grande erro do roteiro, na minha opinião - e Uxbal resvala numa ingenuidade inaceitável para alguém que é médium, quando, no final, pede à filha que não se esqueça da fisionomia dele. Por que um indivíduo versado em assuntos do além-morte estaria tão preso ao ego e à concepção de uma individualidade representada por um aspecto físico? Esse foi o ponto que menos me convenceu...Mas, apesar de todas as ressalvas, dentro da temporada de filmes relativos, Biutiful ainda vale a pena - muito mais do que Árvore da vida, por exemplo.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O caso Neruda

Terminei de ler hoje O caso Neruda, do autor chileno Roberto Ampuero. Quem quiser se envolver numa história policial cheia de passeios por diversos países, tem aqui uma boa pedida. Fora isso, o livro também dá lições de história política e desmascara o homem (extremamente falho) por trás do poeta Pablo Neruda. Mas não queira ser exigente com linguagem ou metáforas criativas; este romance é tão cheio de lugares-comuns e fórmulas descritivas, que me deixou ansiosa, com vontade de largá-lo pela metade. Talvez seja uma injustiça dizer isso, mas a sensação é a de que Ampuero joga com as estratégias de ação de um best-seller qualquer e, apesar de ter boas intenções, não atinge o que se chama de arte - pelo menos, não neste livro (mas eu é que não vou testar um outro; infelizmente, não dá para desperdiçar horas insubstituíveis com literatura que não convence ou fascina).