LIVROS E BICHOS

Este é o blog da Tércia Montenegro, dedicado preferencialmente a livros e bichos - mas o internauta munido de paciência também encontrará outros assuntos.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Procura-se um amor que goste de gatos

Estas imagens foram gentileza do meu amigo Urik, que enviou o post sobre o fotógrafo Fubirai, que há cinco anos documenta a vida dos gatos na ilha japonesa de Fukuoka. Cada uma destas cenas vale um sorriso.Clique nelas para ampliar.

domingo, 25 de novembro de 2012

Mel com Os Espantos

O amigo Plínio Bortolotti foi o responsável direto para que meu mais recente livro surgisse, pois foi ele quem me convidou para publicar, quinzenalmente, crônicas no jornal O Povo - cinquenta das quais acabaram reunidas neste volume, Os Espantos. Agora percebam como sua gatinha, Mel, também foi responsável pelo projeto gráfico da capa...

sábado, 24 de novembro de 2012

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

IX Encontro Interdisciplinar de Estudos Literários

Amigos,

Na próxima segunda-feira, dia 26, começará o IX Encontro Interdisciplinar de Estudos Literários, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Letras da UFC. A programação completa pode ser conferida pelo endereço http://ixinterdisciplinar.blogspot.com.br/p/programacao.html
Às 11h, farei uma conferência sobre medo e prazer na fruição da obra artística. Logo em seguida, haverá o lançamento do meu livro de crônicas Os Espantos. Quem perdeu o evento da Bienal pode aproveitar a ocasião para adquirir a obra por lá.

Bonecos do mundo

No fim de semana passado, tive a chance de conferir um pouco do Festival Sesi Bonecos do Mundo - e fiquei completamente maravilhada! Tenho certeza de que a programação trouxe realmente os melhores artistas (alguns, verdadeiros gênios) em suas técnicas variadas, manipulando bonecos com fios ou outros dispositivos, criando títeres com partes do corpo ou através de sombras - e tudo isso, grátis e aberto ao público, como deve acontecer! O Centro Dragão do Mar virou uma festa de gente hipnotizada pelas belezas desse tipo de teatro, e eu devo confessar que esta foi uma das raras ocasiões em que me orgulhei de viver em Fortaleza, para desfrutar desses espetáculos! Não esquecerei os mágicos "mestres das sombras" do grupo japonês Kakashiza. Também vou levar comigo as imagens de irreverência dos bonecos de Viktor Antonov e Phillip Huber (que chegam a fazer metateatro com títeres, sem limites para o experimentalismo e a inventividade!). Ainda lembro Hugo e Ines, com seus Cuentos pequeños, de personagens nascidos dos pés, dos joelhos, das mãos...E tive ótimos momentos com as criações do Gente Falante, em seu Circo Minimal e no delicado Caixa de música. Havia outros espetáculos, que infelizmente perdi, por causa dos horários - mas só a amostra citada já serve de exemplo do valor desse evento para a nossa cidade. Que venham novas edições do Festival Sesi!



quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Do farelo ao pão - Accademia della Crusca e Padaria Espiritual

Embora os meus impulsos autodidatas não sejam lá muito disciplinados, tento dar seguimento aos estudos de italiano, mesmo após ter concluído a Casa de Cultura (bem sei que se perde fluência rapidinho - olhaí o meu francês para provar isso...). Assim, ontem eu estava mergulhada numa História da Literatura Italiana e, nessa viagem pelo medievo, li a respeito da Accademia della Crusca, que foi criada em Florença, no século XVI, e ainda hoje subsiste como uma importante instituição linguística. Quem quiser saber mais a respeito pode consultar o site oficial, que é riquíssimo de informações sobre a língua italiana: http://www.accademiadellacrusca.it/it/frontpage
Mas o que eu achei interessante nesse estudo foi descobrir que a tal Accademia della Crusca ganhou esse nome porque os seus primeiros representantes não queriam ser pomposos acadêmicos - de forma que escolheram a ideia do farelo (crusca) como indicativo de que se ocupariam de miudezas, dentro de um espírito irreverente, inclusive. Ora, isso imediatamente me lembrou da proposta da nossa Padaria Espiritual, movimento tão cearense e criativo! É de se indagar se existe um vínculo proposital entre os acadêmicos "farinheiros" da Itália de 1500 e os nossos "padeiros". Óbvio que, se houver uma influência direta, isso em nada diminui a importância da Padaria Espiritual (que, aliás, já começa com o mérito de ter um nome bem mais cativante do que Academia do Farelo, hehehe). Provar essa ligação seria muito mais uma curiosidade do que um golpe para ferir algum princípio de originalidade (se é que isso existe, de fato). Alguém pode argumentar, entretanto, que a ideia da arte como "alimento para a alma", seja na forma simbólica de pão, farelo ou migalhas, existe na humanidade desde sempre e não há como estabelecer quem primeiro formulou essa metáfora. Bem, essa opção me parece um tanto comodista, embora não de todo equivocada. Eu ainda acredito que uma pesquisa pode trazer mais material de discussão. Este é um caso de consulta para o professor Sânzio e para especialistas em italiano! 

O predestinado


O PREDESTINADO

Alguns livros, como certas pessoas, já nascem predestinados. Quando a Fundação Demócrito Rocha me convidou para reunir cinquenta crônicas dessas que venho divulgando há dois anos, aqui no espaço Opinião, pensei logo no título Os Espantos. A própria seleção dos textos me conduziu a esse nome, pois a maioria das crônicas trata de vidas insólitas, obras de arte (que quase sempre são espantosas) e situações estranhas ou engraçadas. Mal sabia eu que o livro, assim batizado, continuaria me espantando, embora, como sua autora, eu já devesse ter me acostumado a todas as suas características e possibilidades. O susto, porém, continuou e talvez ainda persista por muito tempo, conforme fico sabendo do destino que essa obra vai ganhando.
            A peripécia começou no caminhão que transportava os exemplares para o lançamento em Fortaleza, a ocorrer durante a Bienal Internacional do Livro do Ceará. Em certa altura da viagem, em Minas Gerais, o motorista perdeu o controle e o veículo tombou, largando a carga pela estrada. Rapidamente, apareceram inúmeras pessoas para se apoderar dos pacotes – e essa cena dos salteadores correndo com caixas literárias é uma das coisas que eu jamais conseguiria, sozinha, imaginar. Mas a vida supera a ficção, e o motorista, mesmo com um dos pulsos quebrado, teve o espírito camoniano de se agarrar com um dos pacotes, para salvá-lo. Foi essa caixa, sobrevivente do saque, que garantiu a quantidade de exemplares para que o meu lançamento acontecesse, na quarta-feira passada.
            Houve rumores de que o acidente teria sido provocado por uma barricada preparada por universitários, que, revoltados com os altos preços dos livros que têm de comprar, decidiram saquear alguns. Ao abrirem os pacotes e depararem com o título Os Espantos, imagino o que não lhes passou pela cabeça...
            Por outro lado, ouvi versões garantindo que o assalto foi planejado por uma única pessoa, um empresário que pretendia montar certa livraria monotemática em Ubá. Os livros, após o roubo, seguiram transportados em lombo de burrinho pedrês até um depósito clandestino, e em breve devem ser levados para a tal livraria. Enquanto isso, alguns exemplares já começaram a circular informalmente e, de pessoa em pessoa, vão ganhando mundo, viajando. Um dos livros até foi visto em Congonhas, na mão do profeta Habacuque, de Aleijadinho.
            A editora providenciou uma nova impressão para substituir as unidades perdidas – mas, para mim, os exemplares salvos pelo motorista são especiais. Com pequenos amassados e pingos de sangue, eles trazem o sinal da esperança. Afinal, se a posse de livros ainda provoca luta, nem tudo está perdido para a literatura!

Tércia Montenegro (crônica publicada hoje no jornal O Povo. Disponível também no respectivo site)







terça-feira, 13 de novembro de 2012

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

terça-feira, 6 de novembro de 2012

O desnorteio


O DESNORTEIO

Talvez não haja grande diferença entre a sensação trazida por uma catástrofe natural e outra, criada voluntariamente por alguém. Um furacão furioso também pode se instalar nas fissuras humanas: tempestades nascem dentro de casas, vendavais que arrebatam ânimos, sopram palavras, cavam abismos. De repente, você está num território que se transformou: o terreno sólido virou desastre, cheio de ruínas. Os objetos parecem cacos, resquícios que se penduram nas paredes ou ficam esfriando nas gavetas, como fotografias que não se quer mais ver. Cenas e rostos reverberam, criando fantasmas – ou serão vapores de lembrança? E, antes disso, houve presságios, brigas inexplicáveis de gatos mansos, houve olhares furtivos e ausentes, a falta de gestos que primeiro não eram notados porque já existiam, espontâneos. Assim a natureza de repente muda: o céu tinha uma cor esquisita, disseram, antes do tsunami. Ainda era um céu, acima de nossas cabeças; nada extremo aconteceu como anúncio; não foi preciso que se revirasse a geografia nem que as nuvens escrevessem alfabetos pelo ar. Tudo sutilíssimo; apenas uma cor diferente, um tipo de vento que jamais arrepiou daquela maneira. E, minutos depois, a onda gigante arrastando sem trégua, tão violenta e poderosa quanto uma mensagem definitiva.
E por falar em mensagem, eu procuro um livro-bússola, impossível. O poeta Vinícius de Moraes não deixou o contraponto, não escreveu Para perder um grande amor. Mário Faustino tampouco descobriu a solução em oráculos, a verdadeira “conjunção de agouros” que tanto pode atormentar, no poema “O homem e sua hora”. Fernando Pessoa – oh, meu Deus! – nem ele, com todos os seus geniais desdobramentos, é suficiente para lidar com desassossegos. Tem razão meu amigo Rafael Martins quando, numa de suas peças teatrais, diz que não há um procedimento para a vida. Como não há maneira de se salvar de calamidades – acrescento. Alguns elencam prevenções, treinamentos que dão uma (falsa) segurança; há os que constroem trincheiras, abrigos subterrâneos, pintam rotas de fuga e aprendem a se manter deitados em caso de relâmpago ou terremoto. Mas nada disso garante. A natureza, quando chega a seu limite, é implacável, embora aja somente como justiceira: sua violência é sempre uma resposta.
Quando se cria intencionalmente um desnorteio, a princípio tudo pode parecer diferente; pelo menos, a causa do desastre foi egoísta: alguém escolheu, hesitou no seu milésimo de ponderação – e depois decidiu. A sua decisão estourou uma represa, fez caírem aviões, despedaçou estilhaços de bomba, deixou um cogumelo de fumaça parada sobre o mesmo local, durante muito, muito tempo. Estava lá um homem que apertou o gatilho, o detonador – mas ele não importa. A única coisa que permanece é o choque, o inesperado desequilíbrio diante da catástrofe. Pelo mundo inteiro, creio que a sensação deve ser idêntica.

Tércia Montenegro (crônica publicada hoje no jornal O Povo)